15 de out. de 2015

Três passos para o fim do mundo...

A deusa dos seres das florestas Mielikki partiu em carga e cravou seu chifre de unicórnio no incomensurável klurichir, ainda brilhando após a ressurreição de seu servo Ehtur. O deus do sol Amaunthor reuniu toda a força positiva que existia em sua essência divina e explodiu como uma hecatombe diurna capaz de expurgar todas e quaisquer trevas. As duas forças primordiais de Abeir-Toril se combinaram numa onda avassaladora que conseguiu exterminar o demônio a serviço de Malkizid, senhor do mal e do caos, desintegrando-o por completo.
- Por mais demônios que vocês destruam, simplesmente não podem vencer. O sol se apagou em Faerun e a esperança sumiu do coração dos seres das mortas florestas. Acabou!!! Lolth venceu. Eu venci!!! Não há sentido em me privar de festejar sobre suas entranhas!!!
Ao fim dessas palavras, que ainda reverberavam por toda a existência do plano, Malkizid se manifestou, enquanto Ehtur Telcontar, Úrsula Suarzineguer, Daphne da Grande Floresta, Sirius Black, John Falkiner, Jacke Line, Yorgói Dossantis e Deborah Pompeios seguiam enfrentando os demônios restantes e suas espadas vorpais como podiam. 
- Esse pode ser o seu plano, esses podem ser seus demônios tudo isso pode ser você, mas hoje não é sua vitória! - Urrou Mielikki investindo contra o deus dos caídos, apenas para desaparecer como num piscar de olhos dele.
- Você é menos que nada! - Malkizid saboreou aquele momento, enquanto a recém-chegada Selune concentrou-se em seu estimado Sirius Black:
- Abra seu coração, meu escolhido... - Disse a Senhora da Esperança se recuperando com as mesmas energias que haviam ressuscitado o ladino. - ...Só assim haverá um caminho para a salvação, pois não há fim sem começos, como não há trevas sem luz.
Dito isso, a deusa da lua usou todo o seu poder não para atacar Malkizid, mas sim para banhar John Falkiner. O clérigo dos deuses élficos sentiu-se inundar por um poder inigualável, maior do que qualquer coisa que já imaginara ou sentira. Por um instante, era como se ele enxergasse infinitos mundos, infinitas eras, infinitas noites, infinitos seres buscando amparo ante o frio da noite.
- Um caminho... - Balbuciou Falkiner ainda aturdido e deixando derramar poder lunar de suas mãos, o que tomou a forma de um portal.
Daphne buscou ganhar tempo assumindo a forma de uma fênix, com êxito dessa vez, e escapando das garras do senhor dos demônios, já que não podia ser agarrada. Ainda assim, incomodado com aquela "mosca", Malkizid aprisionou ela e Jacke na terra de seu mundo, mesmo que a mestra das muitas formas tenha tentado usar os poderes planares de sua forma para escapar dali. Os demais heróis tentaram escapar por ali, mas ainda que houvesse a passagem, ainda não havia o caminho.
- Tolos! - Gargalhou Malkizid agarrando Amaunthor e Selune. - Este é meu mundo! E nem mesmo suas almas escaparão daqui! Vocês serão o meu presente para minha amada Lolth. Com vocês e os outros poucos deuses que restam faremos o sacrifício final para termos não as partes, mas o todo.
- Quanto mais trevas, maior o brilho do sol, fracassado sem honra! - Bradou o deus da luz, mais uma vez reunindo todo o seu poder. No entanto, ao contrário do que pareceu a todos, ele não atacou Malkizid, mas sim desferiu a energia sobre o portal da lua, que somou em si forças que mal algum poderiam conter. O portal mostrou Faerun do outro lado.
- Vamos - disse Ehtur trazendo Úrsula, Yorgói e Deborah. Sirius levou Falkiner como podia.

Todos que cruzaram o portal surgiram no deserto do Anauroch justo quando Malkizid exterminava Amaunthor e pela primeira vez, sem que seu riso ecoasse reverberando neles. Sentiam o doce sabor da liberdade, mesmo que voltando a um mundo moribundo. Os heróis logo reconheceram o maior dos desertos, o grande mar de areia. Eles sabiam que estavam há muitos dias da Grande Floresta, há alguns de Evereska. Mas antes que pudessem pensar mais, John Falkiner caiu de joelhos sobre a areia levando as mãos à cabeça:
- As vozes! As vozes!!!
Enquanto no céu negro sem sol ou estrelas, o tímido risco de uma lua surgiu como a boca triste de um gato, o novo deus da lua ouvia os pedidos desesperados de todos os que buscavam uma esperança contra as incontáveis forças que davam cabo da existência de Faerun. Velhos e crianças, homens e mulheres, animais e plantas, camponeses e reis, milhões eram os que recorriam à senhora da lua, que agora era um senhor. Mesmo tendo sido escolhido da deusa dos elfos, John Falkiner não estava preparado para aquilo.
- Socorro, senhora da lua, a floresta se foi, o mal se alastra...
- Selune, minha mãe, os magos estão invadindo...
- Ó Luna, nos guie contra essas trevas sem fim agora que Amaunthor se foi...
- Selune, senhora da esperança, os drows estão chegando...
- Por favor, Selune, salve meus filhos... os mortos-vivos sem pele...
- Deusa da lua os homens da mão negra levaram todos...
- O grande Lua o veneno dos yuan-ti está matando a todos...
Os pedidos eram tantos e tão misturados, que John Falkiner não conseguia estabelecer uma linha de raciocínio.
- Acho que a razão dele se foi... - Concluiu Úrsula já pensando se não seria melhor dar conta do clérigo.
- Temos que sair daqui... - Ponderou Ehtur. - Temos de ir para Evereska.
Enquanto eles se punham a caminhar, Sirius Black estendeu uma mão amiga e amparou Falkiner. Mais acostumado com as energias lunares, bem como com as trevas inimigas destas, Sirius conseguiu absorver parte daquele poder para si, sentindo-se mais uma vez escolhido da esperança, além de tocar a alma de Falkiner, recebendo parte das vozes e ajudando o aliado a por-se de pé. Isso foi o suficiente para o clérigo recuperar o suficiente de seu raciocínio e teleportá-los. 
Em Evereska, ou melhor, nas ruínas do que um dia fora a bela cidade de Evereska, o guardião Ehtur Telcontar logo viu que os rastros eram de um mês antes. Um novo teleporte os levou até Quíron, o centauro druida do círculo ao qual Daphne pertencera. Ao redor dele, a dor perpétua da mais antiga floresta do mundo dizimada. No centro de tudo isso, o falso mythal expelia negatividade e trevas. Viam por ali outros druidas do círculo como Ferlima e Marcela que nada podiam fazer, pois tinham sorte de estar vivos privados que estavam de seus poderes naquele lugar sem equilíbrio algum
Quando o grupo destemidamente lançou-se contra a esfera de maldade, uma sombra da noite surgiu para defendê-la. Um morto-vivo após o outro, os heróis usaram todo o poder que possuíam, além do amor e da esperança para vingar tantas vidas que iam sendo dilapidadas pelo mal. 
Ao final, exauridos, eles venceram, se é que essa palavra cabia nesses instantes que antecediam o apocalipse. Ehtur Telcontar recuperou o corpo de Alissah, catatônica e quase morta.
- Ela é um espírito de uma floresta que morreu... - Explicou o druida centauro Quírion, que sentia no âmago mais profundo de seu ser toda aquela dor.
- Apenas o seu filho a mantém viva... - Completou Ferlima. - Em pouco tempo ambos vão morrer...
- Nós... Eu... posso salvá-la. Vamos para o meu plano... - Disse Falkiner apoiando-se em Sirius e recobrando algum controle sobre si.

Longe dali, em uma praia, Daphne e Jacke despertaram com as ondas do mar lambendo seus corpos.
- Que lugar é esse? - Pensou Daphne enquanto viu um vulto chegar, que logo revelou-se um estranho gnomo.
O pequenino ajeitou os óculos estranhos e falou:
- O que temos por aqui... Acho que o pessoal não vai acreditar...


Tanto lá, como cá, todos eles, assim que puderam descansar, sentiram em suas mentes a intensidade da visão de mais aqueles sonhos.
Reconheceram Paulo... ou Borracha... Paulo de Morpheus. Ele que se vestia agora como Morpheus, mas também como Lorde Byron. Ele usou seus poderes de viagem planar para deixar o plano material conhecido como Abeir-Toril, do continente de Faerun rumo ao plano do Salão dos Deuses, o Átrio de Ao. .
Todos entendiam que ele cometera um crime. Ele violara uma das regras básicas do jogo. Ninguém entra no plano de um Deus sem ser convidado, mesmo que tivesse poder para isso. E ele agora tinha. Seus poderes de senhor dos sonhos o levavam a qualquer lugar. Era a terceira vez que Morpheus invadia o reino de Lolth, mas a primeira em que o titular não tinha um substituto preparado. Se é que o que Lorde Byron fizera tenha sido realmente prepará-lo.
Quando cruzou a última camada planar, Paulo viu o incomensurável espaço, com assentos iguais e equidistantes de uma tribuna central, um perfeito círculo cujo topo da abóboda culminava numa abertura de onde diziam virem os decretos de Ao.
Byron lhe disse certa vez que o Morpheus anterior lhe disse que houve tempos em que mais de trezentas divindades apertavam-se aqui. Nesse momento, haviam poucas o suficiente para se contar com os dedos da mão. Lá do acento mais alto, podia reconhecer as trevas de Shar, as explosões tempestuosas de Talos, os gritos bélicos de Tempus, os xingamentos tirânicos de Bane, a placidez natural de Silvanus, a doçura fértil de Chauntea e a diplomacia sábia de Oghma.
- Faerun está morrendo... - falava a deusa da agricultura, que parecia velha e cansada, como uma anciã nos seus últimos dias. Mas a chegada dele os interrompeu..
- Mais um julgamento a ser presidido por mim! - Disse Bane subindo na tribuna.
- Sim, Faerun definha, nobre deusa, e junto com ela tudo mais perecerá, plantas, animais, rios e montanhas. Inclusive os deuses. E nós aqui perdendo o tempo que não temos com julgamentos infundados. Pois vejamos ate onde vai a falta de senso deste conselho. Me diga, intempestivo Bane, de que me acusa esse tribunal, legítimo, reitero, muito embora vazio, de Deuses e de senso, pois num universo já desgovernado, que terrível crime cometi para que percamos nosso tempo aqui? Ao que me parece, entrei num templo de uma deusa que não mais cumpre seu papel enquanto divindade no constante trabalho de um universo equilibrado e harmônico, o mesmo faria caso quem estivesse tentando destruir a existência fosse Tyr ou Lathander. O universo precisa permanecer do seu jeito, com cada um dos deuses exercendo o seu papel e olhando pelos seus, num completo equilíbrio e, caso algum desses deuses tente subverter essa balança, sinto que é papel de qualquer agente cósmico contrabalancear as atitudes desse deus, sendo assim não vejo crime algum cometido. E você nobre tirano, com que bases me acusa?
- Não é sua hora de falar, verme! - Urrou Bane golpeando com o punho. - Este é um tribunal dos deuses!
Mas a gargalhada de trovão de Talos silenciou o pretenso juiz: 
- Um tribunal ou um clubinho? Eu não sei porque ainda aguentamos essa merda fétida! A destruição é iminente e eu não vou ficar assistindo esse teatro enquanto tudo com que sonhei está acontecendo...
- Lorde Talos, bem sabe que és uma força do equilíbrio... Um dos deuses naturais... - interviu diplomaticamente Oghma.
- Não venha me encher o saco, bardo de merda!!! - Bradou Talos fazendo um vulcão de lama explodir sob o deus do conhecimento, mas Oghma sabiamente já mudara de lugar.
- Não é permitido atacar ninguém nessa assembléia, Talos! - Urrou Bane golpeando com sua manopla.
- Diga isso a Rhange Hesysthance, juiz negro - alfinetou Shar.
- A guerra está em todo lugar... - O deus da guerra Tempus sacou uma espada e um machado, cada qual mais ensanguentado que o outro. 
Raízes brotaram do chão e envolveram Tempus e Talos, enraizando-os ao chão.
- Ninguém de nós está aqui por ser nada além daquilo que representa - Falou Silvanus lentamente na sua forma de imensa árvore. - Não lhes interessasse essa assembleia e não teriam comparecido. 
- Mas até mesmo vocês três, forças do caos, sabem a ameaça da senhora das aranhas. Sabem que ela e seu consorte abissal estão prestes a fazer o que deveria ser serviço de vocês. Vocês surgiram para destruir esse mundo e não ela. E isso vocês não podem aceitar, não é mesmo? - Oghma surgiu ao lado de Silvanus.
- Isso não é o que importa! Temos de punir esse cretino e depois esmagar a aranha! - Urrou Bane golpeando com sua manopla.
- Por duas vezes nós condenamos Morpheus por invadir o reino dela.. - Falou com doçura Chauntea. - Duas vezes Tyr agiu com justiça e o condenou. Mas isso é justo em tempos como esse?
- Eu me proponho a defender Morpheus... - Adiantou-se Oghma.
- Você aceita seu defensor, bandido? - Indagou Bane derramando chamas verdes pelos olhos.
- E quem melhor para provar minha óbvia inocência? Por favor Oghma, o sábio, explique a esses impacientes deuses sob que, inevitáveis condições, minhas ações aconteceram...
- Antes de mais nada... - Adiantou-se Oghma com um gracejo que conseguiu prender a atenção de todos e fazer Morpheus sentir-se tranquilo de que ele convenceria os demais. - Ao contrário das vezes anteriores, não temos entre nós uma vítima, não é mesmo? Onde está a ofendida deusa que merece ser defendida da ousadia resgatadora do senhor dos sonhos?
- Não é preciso haver a presença da vítima, mas apenas que um dos deuses grandiosos acate sua acusação! - Urrou Bane intervindo e colocando as regras no lugar.
- Esse é meu segundo ponto.. - Retomou a palavra o deus do conhecimento como se já esperasse por aquelas palavras. - Nenhum de nós aqui é porta-voz de tal acusação, não é mesmo?
Houve um instante de silêncio.
- Nenhum de vocês levanta questão? - Irritou-se Bane golpeando com sua manopla negra. - Pois eu o acusaria...
- Se não estivesse presidindo essa seção, não é mesmo senhor da tirania? - Oghma sorriu e fez uma reverência. - Encerro meu caso...
- É isso? O verme está livre? - Gargalhou Talos fazendo as raízes que o continham congelarem ao mesmo tempo que Tempus arrebentou as suas com sua imensa força.
- Se estou livre, só esse conselho pode dizer nobre deus, mas se vocês me permitissem, gostaria de expressar alguns sentimentos em formas de palavras sobre a atual situação de Faerun. Tenho a permissão de vocês para um breve discurso?
- Devaneios... - soou a voz de uma mulher em uma forma arcaica de elfo. - Delírios... - E todos viram que estavam presos a fios de uma teia tão fina que era imperceptível a menos que concentrassem toda sua atenção nela. - Quimeras... É tudo que ele tem a dizer... - Lolth surgiu com seu corpo de aranha e seu dorso de drow.
- Você ousa nos prender? - Enfureceu-se Shar que deixou de ser a mulher de trevas que viam e passou a ser uma névoa negra que se movia entre os fios da teia. - Suas pequenas tramoias deixaram-na ousada demais, pequena Lolth. Eu irei destruí-la e absorvê-la como fiz com todos os que tentaram tomar meu papel...
- Você veio fazer sua acusação? - Disse Bane com satisfação, mas ao perceber que não podia golpear com sua manopla, pois também estava contido pela teia, o tom dele tornou a ser enfurecido. - Como ousa?!? Como tribuno dessa seção nada pode me conter ou atacar!
- Esse tribunal não é nada... Vocês não passam de fantasmas de seus antigos eus... O mundo que vocês representam será meu melhor sacrifício. Mas você... - E ela sorriu olhando Paulo de Morpheus. - Para você tenho planos especiais...
- Não temos medo de você! - Respondeu Chauntea lutando contra a teia e se enrolando mais nela como uma mosca assustada.
- As sementes sempre irão germinar! - Limitou-se a dizer Silvanus impassível.
Talos tentava queimar, congelar, dissolver, eletrocutar e estuporar as teias apenas para se ver preso nelas de novo, da mesma forma que Tempus, que as cortava para ser pego nos fios soltos que iam formando um casulo. Apenas Oghma observava em silêncio.
- Eu sou a Senhora do Caos... - sibilou Shar, que embora solta, não parecia conseguir avançar devido ao movimento constante da teia.
- Você não é nada!!! - Disse Lolth vindo até Morpheus e pegando-o com uma de suas patas de aranha imensa.
- Argh!!! Ardilosa!!! Há muito eu avisei este conselho e enquanto perdíamos nosso tempo, ela preparava um ataque...
Morpheus era o senhor dos sonhos e não conhecia fronteiras. Ele era uma entidade cuja existência se abria para todos os planos. Mesmo ali, o salão dos deuses de Faerun não era mais do que um plano. Um grão de areia no deserto planar. Uma gota no oceano da existência. Com isso, ele deixou a materialidade daquele lugar tão logo desejou escapar. Ao contrário dos demais, ele não estava preso àquele lugar ou àquelas teias de magia de sacrifícios. Nem mesmo ao toque da deusa Lolth, senhora suprema de Faerun. Paulo de Morpheus surgiu novamente no salão dos deuses, à frente de Bane. Podia se mover, mas enquanto fosse julgado sabia que sempre seria mandado de volta para lá. Regras.
A atenção de Lolth, no entanto, não se perdera dele. E isso bastou para Shar conseguir cobri-la com uma escuridão total. Foi como se parte daquele lugar deixasse de existir, retornando ao nada que antecede o existir. 
- Está feito... -Disse Shar com satisfação na mente de todos, mesmo que as teias perdurassem. - Agora quanto a todos vocês...
- Calada!!! Voce é apenas um lado da balança deusa da escuridão, e saiba, não é nem nunca foi o lado mais forte... - Bradou Morpheus.
A escuridão que era Shar voltou a falar, mas dessa vez foi a voz de Lolth que se fez ouvir:
- Você crê mesmo que eu esteja ainda ao alcance de sua entropia, Shar. Você foi a primeira, mas não será a última... - As trevas que eram a senhora da escuridão se adensaram e uma vez mais Lolth estava lá. Nada restara de Shar.
- Não é possível... - Talos não conseguia disfarçar toda a sua surpresa.
- Shar não pode ser destruída! - Decretou Bane. - Ela irá retornar! Ela sempre retorna!
- E se não houver para onde retornar, juiz negro? - Desafiou-o Lolth. Paulo percebeu que as teias que prendiam os demais pareciam apertá-los agora, sugá-los e enfraquecê-los. Chauntea tombou desacordada, estava enrugada como uma velha anciã, murcha como uma ameixa seca.
- Se você matá-la, eu irei... - começou a falar Silvanus, mas ele mesmo entendeu que seria apenas uma bravata.
- Ela vai matar todos nós... - disse Tempus conformado. - Ela venceu a guerra...
- Quanto a você, pequeno verme sonhador... - Mais uma vez a senhora das aranhas se dirigiu para Morpheus. - Você não terá a mesma sorte dessas pálidas sombras que sumirão com essa rocha insignificante chamada Faerun. Você irá sofrer de maneira especial, você sofrerá como eu sofri por tanto tempo!
Antes, no entanto, que ela o alcançasse, Paulo de Morpheus usou de seus poderes para sumir dali. Mais uma vez ele foi devolvido ao plano em que era julgado, mas apareceu atrás de Lolth. Ele sacou sua espada curta, que recebera a energia luminosa do Cetro de Lathander, quando ele e Byron escaparam dos yuan-ti nas Selvas de Chult, e deu um ataque surpresa nas costas da deusa. A lâmina encontrou resistência, mas a luz solar que se seguiu fustigou a carne, enquanto o corpo aracnídeo de Lolth se contorceu desesperado.
Isso pareceu enfraquecer as teias. Silvanus conseguiu rebentá-las e tomar Chauntea em seus galhos. Talos se libertou mas exitou. Tempus, pelo contrário, ergueu seu machado com as duas mãos e avançou em carga, decepando a cabeça dela, que rolou no chão derramando um sangue verde gosmento como o que cobria a lâmina de Morpheus.
- Ainda temos um julgamento pra acontecer? - Perguntou Morpheus em tom desafiador.
Bane ajeitou as manoplas negras nos punhos:
- Creio que..
- HAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHA!!! - A gargalhada sinistra da cabeça decepada de Lolth silenciou o juiz negro dos deuses que restavam em Faerun. - Vocês não podem me deter, verm...
Tempus pisou sobre a cabeça esmagando-a como se fosse uma aranha. Isso fez o sangue verde espirrar.
- É inútil! - Pensou Talos. - A destruição total não pode ser detida! - E o deus da destruição explodiu um relâmpago colossal sobre o deus da guerra. Raios secundários atingiram todos os demais. Mas todos ali se mostraram imunes àquela investida. O clarão serviu apenas para que nada mais se visse do corpo monstruoso de Lolth.
- Maniaco desgraçado! Vou adorar fazer isso!! - Tempus partir com suas armas contra Talos.
- Parem com isso!!! - Urrou Bane.
Mas Tempus caiu a meio caminho da carga contorcendo-se como se algo o corroesse por dentro.
- Saiam daqui... - Disse Oghma e Silvanus e Chauntea já não estavam mais lá.
- Ninguém deixa o julgamento! - Urrou Bane furioso e golpeando com a manopla.
- Ninguém... - a voz de Lolth soou no ar como um riso sarcástico...
- Nenhum de nós pode sair, mas existem aqueles que podem saber... - Disse Morpheus sumindo mais uma vez justamente quando o corpo de Tempus começou a se erguer e mover-se de forma aracnídea.
- Ninguém sairá, pois não há para onde sair! - A voz de Lolth saiu da boca de Tempus, justo quando Paulo de Morpheus retornou ao plano dos deuses, ao lado de Bane.
- Eles acharão o livro... o cetro... a pedra... o olho... o cálice... E isso, nem você pode destruir, mas eles podem destruí-la!
Foi então que todo aquele lugar, como uma mandíbula, fechou-se sobre os deuses que restavam de Faerun e sobre Paulo, o último Morpheus.



2 de out. de 2015

Eu, Derdeil


A bela elfa e o sisudo elfo recém surgidos cercavam Kaliandra Boaventura como a uma mãe. Tudo ainda era muito confuso para ela, que trazia em si a essência do feminino élfico e parecendo dominar a percepção dos dois novos seres. A trovadora da espada buscava o nome da deusa dos elfos que lhe escapava como se algo a impedisse de pronunciá-lo. 
Mari'bel sabia que nada ali poderia estar certo estando sob o domínio do deus da magia. A killoren apenas buscava ajuda, um equilíbrio que fosse possível orando aos deuses que sabia cuidariam disso. No entanto, também para a fada era impossível pronunciar os nomes. Então, ela seguia ali ajoelhada na grama da clareira a orar. 
Rufus Lightfoot e Ohterrível voaram dali assim que sentiram o tremor e viram as chamas irromperem ao longe. Subindo acima da clareira, os dois puderam ver o vulcão ao sul que cuspia lava e fazia a terra tremer. O dragão que crescia cada vez mais tinha certeza que haveriam dragões lá, os primeiros dragões desse novo mundo.
- Mas você é o primeiro dragão desse mundo, Azuzu... - Ponderou Rufus sem concordar com a linha de raciocínio de Ohterrível.
Porém, naquele novo mundo, nenhum deles era como Derdeil Óphodda, escolhido de Rhange Hesysthance, o único e verdadeiro deus. Mais do que a magia, agora toda a realidade estava subordinada aos seus desígnios.
- Cada desejo se torna realidade! - Bradou o deus terminando o movimento que conformara o surgimento da cadeia montanhosa do vulcão, que ia se formando da lava que jorrava. - Nós somos os próprios fundamentos da existência de Faerun.
- Eu entendo, mestre. É um poder infindável! - Concordou Derdeil, que para demonstrar que entendera, conjugou o poder fazendo o pequeno corvo familiar, Edgar, crescer, tornar-se um corvo gigante, passando a olhar seu senhor com a expectativa de ter cumprido algo digno.
- Mais, mestre, mais! Torne-me uma águia careca americana!!! - Gritava Edgar intoxicado pelo poder.
A cajadada na face de Derdeil foi a resposta que o lançou ao solo.
- Não tema o poder, Derdeil. Aceite o máximo poder! - Disse Rhange deixando o tecido mágico pulsar com seus desígnios. - Não é hora de brincadeiras pueris, mas sim de ações afirmativas!
O único deus que havia lançou as ondas energéticas sobre os dois elfos que cercavam a elfa-mãe Kaliandra Boaventura, bem como do elfo verde que primeiro chegara. O que era até então verde e esguio metamorfoseou-se no que parecia muito mais uma planta ambulante do que um gracioso elfo. A menina ganhou asas formosas e ares angelicais, bem como o rapaz recebeu chifres, garras e asas demoníacas.
- É disso que estou falando, meu velho - vangloriou-se Rhange satisfeito com suas novas criações, mais condizentes com seu novo mundo. - Faça o que tu queres, pois é tudo da lei. Da sua lei!
Derdeil Óphodda levantou-se mais determinado dessa vez. Ele percebia que não haveriam limites além dos que ele mesmo desejasse impor. Ele fixou os olhos em sua amada Kaliandra e ela sentiu que algo mudara dentro dela. Sua carne teve espasmos como se um espírito maligno a invadisse. Derdeil plantou sua semente no ventre da elfa e ela sentiu seu corpo ser conspurcado. Ela tentou arrancar aquilo de seu ventre com sua espada, mas foi contida pelos elfos, derramando apenas uma parte do seu sangue. Isso fez com que três vezes repetisse um nome com sede de vingança:
- Valquíria. Valquíria. Valquíria!
A trovadora da espada viu uma cisão surgir no espaço-tempo e a guerreira vingadora alada surgir. Além da espada desproporcional, a valquíria buscava o responsável por interromper os caminhos da vingança.
- Suma! - Desejou Derdeil e foi isso o que aconteceu de imediato. Mas por outro caminho a valquíria retornou.
- Sua missão está cumprida, Valquíria! - Ela disse olhando para Kaliandra. - Mas seu espírito não está mais livre!
Enquanto isso, a pequena Mari'bel mesmo sem conseguir pronunciar os nomes divinos que buscava conseguiu harmonizar-se com aquelas forças vitais tão familiares às da Grande Floresta que ela carregara em si. A killoren deixou aquela materialidade que a limitava e mergulhou no próprio espírito daquela mata. Ela sentiu-se a própria deusa daquilo tudo. Por um instante, ela percebeu que também havia necessidade e lugar para o equilíbrio naquele novo mundo e que o equilíbrio sempre achava um caminho.
Mas Rhange Hesysthance a ceifou desse vínculo devolvendo-a ao seu corpo de fada:
- Nada disso, menininha. Que tal você se limitar aos seus limites... - E tendo dito isso, o deus fez dela uma árvore, ali enraizada na clareira.
Primeiro, Mari'bel sentiu-se limitada. Não percebia mais Rhange, Derdeil ou Kaliandra. Não tinha visão ou audição. Porém, logo, pelas folhas e galhos, ela sentiu a proximidade das demais árvores que lhe comunicavam no farfalhar:
- Seja uma árvore.
A killoren resistiu no princípio, pensou ser aquilo mais uma tramoia do maldito deus. preferiu centrar-se em si mesma e concentrar-se de novo. Mas quando o elfo transmutado em ser-planta veio e a abraçou, entregando a ela suas energias, tudo pareceu fazer sentido. Mari'bel percebeu que qualquer que fosse a forma, nada poderia limitá-la, nada além dela mesma, pois tudo agora era uma questão de energia.
Enquanto isso, a Valquíria buscou por Kaliandra, mas Derdeil não permitiu a ela estar naquele plano que lhe pertencia. Se não podia expulsá-la, o poderoso mago usou de seus poderes e finalmente destruiu o que havia de vida nela. Possuída por uma fúria e mesmo com os dois elfos, que insistiam em chamá-la de mamãe tentando contê-la, a trovadora da espada atirou-se sobre a carcaça morta da Valquíria que ela convocara. Esse toque foi o suficiente para despertar o poder de Valquíria em Kaliandra Boaventura. Suas asas irromperam, assim como o poder a contagiou, ainda que seu ventre não parasse de crescer num ritmo sobrenatural.
Já bastante longe dali, Rufus e Ohterrível já avistavam os vultos dos primeiros dragões em meio aos picos dos vulcões. As criaturas gargãnticas pareciam lutar entre si. Haviam vermelhos e dourados. Uma dúzia deles ao que parecia. A batalha parecia sangrenta, enquanto a lava jorrava e as montanhas ainda se formavam.
Mari'bel usou da própria energia, da energia do elfo que recebera e da energia das árvores irmãs que a cercavam para comungar com todo o equilíbrio natural uma vez mais. Ela transformou-se em uma imensa sequoia, bem como tornou-se a alma daquela floresta. Como uma deusa da natureza, ela sentia cada ser vivo ali como um átomo de seu ser, cada espírito como uma fagulha de sua energia, cada respirar como um movimento de troca em sua própria harmonia. Isso foi suficiente para resistir à nova investida do deus Rhange, que já não era mais o único nesse mundo. Isso também expandiu ainda mais a percepção dela, abrindo a passagem pra seres feéricos e naturais que se multiplicaram para povoar a Grande Floresta em expansão.

Para contê-la, o primeiro deus Rhange Hesysthance, que se já não era mais o único, ainda era o maior, criou um cinturão desértico, uma área morta e sem vida que a floresta era incapaz de suplantar e onde a influência da nova deusa era impossível. O deserto era voraz para devorar as árvores, como se o vento que trazia a areia carrega-se a morte. Além disso, espectros sombrios e malignos começaram a vagar dentro da floresta e atacar seus habitantes com drenos de energia vital.
Por sua vez, na clareira que era o coração daquelas matas, Derdeil fez seu poder ser supremo, transformando-se numa chaga, num câncer que devoraria tudo por dentro. Ele arrancou cada madeira de cada árvore que ali havia e transformou-as no alicerce de sua imensa torre, que ocupou todo aquele espaço, tensionando os limites internos da floresta e destruindo inclusive a sequoia que era Mari'bel.
A deusa da natureza não se conformou a isso e brotou novamente a partir das raízes restantes no âmago da terra preta e úmida, irrompendo torre a dentro, enquanto Kaliandra buscava alcançar Derdeil e fazê-lo pagar por brincar não só com seu coração, mas também com seu corpo. Entretanto, a gravidez estava avançada e a barriga pesava demais. O parto se iniciou.
Derdeil Óphodda ergueu Kaliandra suspensa no ar e do ventre da elfa e Valquíria, um casal de bebês surgiu. Uma menina meio-elfa linda, tinha os traços do pai, era forte e robusta. Um menino meio-elfo malformado, fraco e raquítico de traços similares aos da mãe. As lágrimas desciam dos olhos da mãe imobilizada, enquanto as crianças flutuavam em direção ao nefasto pai.
O deus da torre no centro da Grande Floresta alcançou o menino, cujas feições lembravam as da mulher amada, que agora se via livre. Desvencilhando-se, ela correu para a grande árvore próxima e abraçou-a. Do sangue que ela vertia em contato com a casca da sequoia brotaram 42 crianças elfas da natureza, como o primeiro elfo planta que auxiliara Mari'bel. Derdeil não se importou com aquilo. Ele olhou por um instante a face acanhada do bebê, seu próprio filho, e sem titubear o degolou com sua adaga.
- Agora eu terei todo o poder, com o maior dos sacrifícios!!! - Foi o que ele disse enquanto era envolto por uma névoa sombria surgida do nada. A mesma névoa encobriu Kaliandra e Edgar.
Os três se viram juntos e cercados pela névoa. Ali também estava Mari'bel, mais uma vez materializada como uma killoren. As duas mulheres não suportaram aquela situação percebendo que o próprio ar que respiravam naquele lugar era maligno, mesmo que as estranhas brumas impedissem de ver o que mais havia. A torvadora da espada sabia que estavam em outro plano: um plano da pura maldade. 
- Não há outra solução... - Disse Mari'bel com convicção antes de tirar a própria vida.
Elas se mataram na esperança de que isso as arrancasse dali, mas suas almas continuaram presas naquele lugar. Mari'bel levantou-se como uma fantasma e Kaliandra como uma banshee, ambas atormentadas por Derdeil Óphodda, o senhor supremo daquele sinistro lugar. O mago não pode deixar de sentir a perda de sua amada, que parecia que finalmente seria sua, mesmo já não restando nada de vivo nele. 
No afã louco de tê-la de volta, ele conjurou todo o poder e arrancou de suas próprias lágrimas de sangue frio, do corpo de Edgar, da essência de Mari'bel e até mesmo dos confins longínquos da existência, energias residuais do que fora Kaliandra Boaventura para devolver a vida a seu corpo. Porém, ao invés de uma divina ressurreição, deu-se um profano efeito. Isso formou uma nova Kaliandra, um clone apático e sem vida dela, além de arrancar Rufus Lightfoot e trazê-lo para junto deles. O hobbit estava incrédulo, pois tinha acabado de chegar com Ohterrível ao covil dos novos dragões restantes, depois de ver Rhange Hesysthance chegar a um acordo com eles.
Testando os limites de seu poder, Derdeil Óphodda plantou mais uma vez sua semente em Kaliandra, ainda que aquele fosse um corpo morto e animado apenas pelos seus poderes. Enquanto o espírito dela seguia ali dando gritos desesperados e terríveis, o corpo dela tornou-se um morto-vivo, um carniçal. Ao mesmo tempo, uma nova torre surgiu para o lich mago senhor daquele plano. Junto com ele vieram três lacaias submissas a Derdeil, assim como uma floresta foi sendo revelada pelas brumas, onde Mari'bel buscou refúgio. 
Mas as investidas profanas de Derdeil Óphodda ainda não haviam acabado. Ele arrancou o feto natimorto do ventre da carniçal que fora Kaliandra e o plantou no ventre de uma de suas lacaias. Ali selado, um novo desenvolvimento o aguardava.
Enquanto o tormento rebuscado de horror prosseguia, Rufus vagou pela torre desesperado e torcendo encontrar talvez uma passagem para outro plano. Acabou encontrando um estranho aposento repleto de estátuas, várias delas familiares, todas elas pessoas ligadas a Derdeil. Mas o mago lich o expulsou do que parecia ser sua mente arrancando-o pelo próprio nariz. 
Enquanto Kaliandra lutou para recuperar seu corpo, apenas para sentir as dores de morrer novamente, o homem que ela amara um dia seguiu criando uma lagoa de sangue no centro da torre, de onde suas lacaias iam beber, ao mesmo tempo que Edgar reivindicava uma morada para si, um Ravenloft. E tudo isso enquanto as brumas se expandiam e iam revelando cada vez mais, um novo mundo de onde não havia como escapar...

25 de set. de 2015

Só o amor destrói...


Entre a dúvida se aquilo era apenas mais uma ilusão e a visão dos elfos ao longe, o grupo travou uma longa discussão. Não parecia haver como retornar. Derdeil Óphodda tentou desfazer a ilusão, mas sua magia de desfazer magias apenas afetou a área como faria normalmente, mesmo que empunhasse o amuleto em forme de Z. Kaliandra Boaventura sentia o desejo de ir contra os elfos e encontrar Shei Long para dar cabo de seu nêmesis, mesmo que fosse uma ilusão. Mari'bel dedicava-se aos rastros, que tão logo se afastou o suficiente da base da montanha, percebeu serem de dezenas de elfos de pés pequenos que surgiam ali e seguiam para o norte. Eles existiam acima de rastros de animais de cerca de cinquenta dias atrás. Edgar voou à frente para ver a multidão de elfos em marcha, enquanto Ohterrível, que não parava de crescer, voou para o alto da montanha.
Pegando o amuleto de volta, Rufus Lightfoot resolveu ele mesmo ativá-lo. Através de sua concentração, ele percebeu que seus sentidos estavam ampliados, mas seus colegas viram que isso veio com a mudança dos olhos e orelhas do hobbit, que pareciam monstruosos agora. Ao invés de assustá-lo, isso o incentivou a continuar. Uma nova tentativa fez o pequenino se sentir mais ágil do que nunca, mas o fez ter pernas peludas de carneiro como um fauno.
Tudo isso, no entanto, ficou em segundo plano quando Ohterrível retornou com um gargântico dragão vermelho. Apesar do temor inicial, a criatura conversou com eles e estava decidido a ajudá-los. O dragão Arishvashtrinclis disse que podiam chamá-lo de Ari e ofereceu-se para levá-los em suas costas, enquanto ia explicando a perfeição que era aquele mundo comandado pelos dragões.
- A Primeira Floresta é o território sob o domínio de Invaerhnum... - Ele ia dizendo e lá do alto eles podiam avistar a massa verde que se estendia para o norte, o oeste e o leste até o limite de suas vistas. Mari'bel mal continha a felicidade em ver seu lar pleno e imaculado, enquanto o dragão ia explicando como o domínio do dragões nunca havia sido desfeito nesse mundo.
Ao passarem pelos elfos, estes curvaram-se e reverenciaram o gargântico dragão vermelho. Nesse momento, com sua pequena luneta, Rufus reconheceu uma elfa verde entre os inúmeros elfos de pele dourada. Era a amiga de Kaliandra, Trina Blair. O hobbit que que escamoteara suas mudanças usando um chapéu de disfarce alertou os demais, pois seguia separado voando sobre Ohterrível, que já era grande como um cavalo.
Uma mensagem mágica chegou a ela, mas a arqueira elfa verde não aceitou as palavras, pois afirmou que Kaliandra estava morta há cinquenta anos. Isso levou a um debate por mensagens mágicas, mas Ari prosseguia voando para a Primeira Floresta, enquanto os guardiões elfos montados em grifos abriam caminho.
Três dragões verdes chegaram para recebê-los. Quando pousaram, Mari'bel aproveitou para comungar com aquelas árvores que eram como suas mães, suas irmãs e suas filhas. Foi nesse momento, quando as energias mais puras e primordiais se conectaram, que a ilusão tornou-se insustentável.

Todos viram-se uma vez mais na fonte. Rufus Lightfoot nada tinha de suas transformações. Mari'bel sentia a dor do vazio de perder a Grande Floresta, mesmo uma Grande Floresta ideal que nunca existira. A killoren buscou novamente por rastros, mas nada havia. Estavam ali, como sempre, apenas as portas coloridas. Não havia sinal nem mesmo do caminho pelo qual eles haviam chegado até ali.
- É inútil escolher qualquer caminho. Será apenas outra ilusão! Isso aqui já é outra ilusão! - Protestou Derdeil Óphodda.
- O que fazer, mestre? - Gralhou Edgar. - Só temos ilusões...
- Não só... Existem coisas que foram reais... Você não é mais um kobold, não é mesmo?
- A mulher githyank cara de sapo também sumiu...
- E o que você sugere, Derdeil? - Questionou Kaliandra.
- Eu preciso de poder. De poder e do amuleto... Só assim poderemos vencer o poder que nos prende nessa espiral labiríntica maldita!
- Você quer que entreguemos nossa força vital? - Desconfiou Mari'bel.
- É nossa única esperança. Se não sacrificarmos nossas vidas ilusórias nunca despertaremos para a realidade, Mari'bel. Chega de andarmos em círculos! Eu tenho o poder do fogomágico e irei queimar minha própria essência para nos tirar daqui...
O olhar do escolhido do deus da magia fitou os olhos de Kaliandra Boaventura com a mesma determinação arrogante do dia em que se conheceram em Invernunca. Algo no peito dela dizia que ele sabia do que estava falando. Algo nela acreditava nele.
- Está bem... Se esse é o preço da minha vingança...
Mesmo com menos convicção, mas cansados de tantas voltas, reviravoltas e retornos, Rufus, Ohterrível e Mari'bel também concordaram. Dentro da fonte, Derdeil Óphodda absorveu aquela energia que lhe era entregue, empunhou o amuleto de Zalathorm e derramou todo o fogmágico que seu corpo podia comandar. Por um instante foi como se a própria realidade não desse conta de tanta energia. 
Depois, ele viu-se em um lugar quente e enevoado.

- Parece que eu subestimei sua capacidade, Óphodda. Mas não cometerei esse erro de novo... - soou a voz de Zalathorm.
Derdeil não teve sequer a chance de responder, pois já estava mais que paralisado, uma vez que seu corpo era incapaz de seguir o fluxo temporal. Sua mente e seu corpo estavam entregues agora a um estado de ausência eterna.
- Mestre Zalathorm, queira entender... - tentou falar Edgar que chegara no ombro do escolhido do deus da magia.
- Não dessa vez, ave traiçoeira! - Decretou o nethyarca supremo de Halruaa fazendo o mesmo com o corvo. - É incrível que mesmo com suas tramoias e seu apetite servil pela destruição, tenha ainda a fidelidade dos seus, mago.
Um a um, Zalathorm usou seus poderes para libertar a energia vital dos demais das tramas pessoais de Derdeil Óphodda. Primeiro veio Rufus Lightfoot, que pode ver o velho mago nu em meio à névoa. Depois foi a vez de Mari'bel. Enquanto eles se recuperavam e tentavam entender, chegou Ohterrível. Por último e mais difícil de separar foi Kaliandra Boaventura.
- Mesmo condenados a partir com esse mundo após perderem minha primeira oferta, vocês conseguiram retornar para a possibilidade de um amanhã. Ainda assim, vocês quase serviram de combustível para a ganância e a cobiça desse servo do excomungado maldito.
- Nós ainda queremos salvar Faerun... - Interviu Mari'bel. - Em nome do equilíbrio. Temos de impedir os planos da aranhuda maldita!
- Não há mais uma Faerun a salvar! - Anunciou o nethyarca sem parecer realmente triste com aquilo. - A senhora das aranhas completou sua missão
- Não é possível! Eu ainda preciso de minha vingança... - Lamentou Kaliandra. - A aranhuda não pode ter vencido!
- O que tinha de ser já o foi. Ela realizou o sacrifício desse mundo que julgava alçá-la além dele para prender o próprio fluxo da existência em sua teia. No entanto, ela acabou consumida na pira de seu próprio incêndio, assim como tudo mais além de nós. Somos tudo o que restou. Faerun vive apenas em nossas memórias. Agora devem entender que são seres do universo e não de um mundo.
- Uhu... pirata dos planos... - Rufus ajeitou o tapa-olho. - Vamos Azuzu III.
- E Derdeil? - Questionou Kaliandra olhando para o homem paralisado e alheio a tudo ali.
- Ele terá o mesmo destino que seu mestre e seus planos... A ruína! - Disse Zalathorm esticando um indicador para completar a invocação anaquiladora.
- Eu não acredito que Rhange esteja destruído... - Foram essas as palavras da trovadora da espada que mudaram tudo.

Zalathorm não teve tempo para expressar sua surpresa ou frustração. Rhange Hesystance, o deus da magia estava ali antes que o som da última letra escapasse aos lábios da elfa. Não havia mais névoa ou calor. Zalathorm já não estava mais lá. Nem sequer um grão de seu ser restou.
O sinistro deus sorriu como um maníaco para Kaliandra, ao mesmo tempo que Derdeil Óphodda e Edgar recuperavam sua pertença ao fluxo temporal daquele pequeno bolsão dimensional que pertencera ao nethyarca de Halruaa, mas que tinha um novo senhor agora:
- Parabéns, Derdeil. Você saiu melhor que a encomenda... Até mesmo o amor que você plantou nessa mulher nos serviu bem. E agora temos todo um mundo para moldar sem que haja quem possa nos deter!
Edgar voou e posou sobre o ombro de Rhange crescendo como um corvo salvagem.

Em um instante, a casa de banhos não existia. As árvores que Mari'bel via lembravam-na da Grande Floresta. De seus pensamentos vieram também cogumelos, flores, insetos, anfibos e pássaros. Ourtos seres iam se apresentando, surgindo entre as árvores. Um treant, um centauro, elfos.
- Mas e quanto aos demais deuses, mestre? - Dizia Derdeil ainda aturdido com tudo aquilo.
- Não existem deuses, Derdeil. Nunca existiram! Nunca vão existir! Só existe um deus, Rhange Hesysthance!!!
- E Óphodda é seu profeta... - Completou Edgar.
- Mas e Selune? - Disse Derdeil exitante.
O golpe do cajado de Rhange em sua cara o calou e o lançou ao chão, enquanto uma lua despontou no céu como o sorriso de um gato. O deus da magia gastou menos que o tempo de um olhar com o astro celeste.
- Não tenha medo de dominar, Derdeil! Você tornou tudo isso possível! Até mesmo quando agiu despropositadamente como amando aquela tola, você estava plantando as sementes de nossa vitória! Agora é a hora de nossa colheita, meu filho! Levante-se e governe!
- Bibiana.. - Murmurou Kaliandra vendo os elfos que chegavam, mas nada aconteceu.
Por sua vez, Derdeil Óphodda avançou até o centauro e o degolou com um só golpe de sua adaga embebida em fogomágico. Quando o corpo da criatura tombou, duas novas emergiram, um humano e e um cavalo.

18 de set. de 2015

Tudo que é sólido desmancha no ar


Derdeil Óphodda percebia fragmentos de outros planos na junção da porta multicolorida. Ela surgira em pleno ar à frente deles depois que voltaram mais uma vez de uma ilusão para a fonte onde as alucinações começavam. Mari'bel olhou pelo chão e viu os rastros de um humano andando de cócoras para esta porta. As pegadas vinham do ponto da parede onde haviam encontrado a porta marrom do peixe invisível.
Rufus Lightfoot tentou tocar a porta multicolorida em busca de armadilhas ou pistas, mas o hobbit-aranha e pirata espacial acabou paralisado.
- Foi uma das cores apenas... A verde creio... - Entendeu Kaliandra Boaventura analisando as forças cromáticas primordiais a todo o espectro mágico. - Isso não é simplesmente um tipo de magia. É algo inerente a qualquer tipo de magia.
A guardiã killoren se debruçou sobre aquelas pegadas e sabia que se tratava de alguém poderoso, ancestral e que não era nenhum daqueles cujos rastros ela acompanhara até aqui. Percebeu que havia algo de ritualizado naquele estranho modo de se mover.
- Não temos tempo para mais disso. Edgar imite esses passos! - Ordenou Derdeil ao seu familiar corvo em forma de kobold.
- Assim ó... - explicou Mari'bel mostrando como.
O pequeno Edgar fez como ordenado e ao encostar na porta, desapareceu junto com ela. Rufus voltou a se mover.
- Nem sinal deles.. - Mari'bel atravessou o lugar.
- Não sinto mais Edgar... - ponderou Derdeil.
- Outro plano é o que parece... - falou Kaliandra.
- É esse o peixe? - disse Rufus Lightfoot ao pegar o peixe invisível e cair de bunda na água da fonte, o que fez a água espirrar no dragão Ohterrível.
Isso também fez com que se abrisse a porta marrom de onde saíam os rastros. Mas atrás da porta estava mais uma vez o inevitável de formas geométricas e tom mecânico:
- Vocês perturbam o fluxo dos planos e devem ser julgados por isso.
Rufus se adiantou às ações do extraplanar, conseguiu se mover e espiar do outro lado vendo o aposento repleto de rodas dentadas, placas metálicas e outras engrenagens. Depois disso, foi como se o próprio tempo parasse.

Edgar viu-se em um lugar quente e úmido. Havia muito vapor no ar e o chão era liso. Ele caminhou e conseguiu evitar cair em uma grande piscina que havia ali. Enquanto margeava a borda, ele ouviu uma voz:
- Seja bem vinda, pequena criatura. Você e seus companheiros realmente se superaram para chegar até aqui...
- Zalathorm? - O familiar questionou incrédulo vendo o velho enrolado em uma toalha branca.
- Vocês poderão sobreviver ao que parece a esse mundo.. - prosseguiu falando o velho.
- Queira perdoar a incompreensão vossa magnanimidade, mas é que estou preso nessa forma vil e monstruosa. Não fosse isso, fosse eu um belo corvo como antes e entenderia sua sabedoria.
- Não seja por isso... - disse o nethyarca supremo de Halruaa. Em um instante, Edgar era de novo um pequeno corvo negro. A emoção foi tamanha, que ele não tinha palavras por alguns segundos.
Quando o fluxo temporal retornou, todos viram-se presos até o pescoço por casulos metálicos, não conseguiam ver os próprios corpos e nem mover um músculo sequer. Com apenas as cabeças livres viam o imenso inevitável que se assemelhava a uma esfinge. Flutuando próximo estava o inevitável que os capturara.
- Estes que aqui são apresentados, Derdeil Óphodda, escolhido de Rhange Hesysthance, do reino de Halruaa em Faerun, Abeir-Toril no ano das Tempestades Relampejantes, Mari'bel da Grande Floresta, serva de Timothy Hunter, Rufus Lightfoot, também conhecido como o pirata espacial Hobbit Aranha, Kaliandra Boaventura, espírito materializado da capitã de Myth Drannor no reinado de Amídala Ancalímon no ano da Ascensão dos Elfos, Óhterrível, representação da jovialidade bondosa dracônica e agora dragão de bronze errante, doravante denominados de acusados, são responsáveis por ininterruptas viagens planares, desequilibrando a harmonia móvel dos planos da existência muito além de suas prerrogativas como naturais de regiões definidas da realidade. Sendo assim, os acusados infringiram muitas regras que incorrem em penas gravíssimas.
- Isso é uma ilusão... Mais uma ilusão... - Gritou Kaliandra. - Isso não é real, não é real, não é real...
- Eu não aceito tais acusações! - Protestou Mari'bel. - Em tudo que faço sou uma agente do equilíbrio. Toda a minha existência tem se pautado pela luta e pelos ensinamento do equilíbrio. Quando minhas mãos energizadas buscam acalmar um ferido ou quando meus dedos ágeis disparam contra os agentes da senhora das aranhas, eu sou uma agente do equilíbrio. Ouvindo a sabedoria do Primeiro Pai, sentindo o amor da Primeira Mãe, brilhando a força vital das fadas e da natureza, eu tenho sido uma agente do equilíbrio. Desde o equilíbrio da menor e mais simples semente até o equilíbrio dos mais longínquos e incompreensíveis planos! Eu sou uma agente do equilíbrio!!!
- Você não cumpriu o seu papel! - Os olhos da esfinge metálica brilharam com um azul intenso e Mari'bel foi totalmente obliterada restando apenas uma marca de queimado no ponto onde ela estivera presa.
- Isso é uma ilusão... Mais uma ilusão... - Gritou Kaliandra Boaventura. - Isso não é real, não é real, não é real. Eu vou ter minha vingança!
- Sua vingança dar-se-á assim que esse mundo complete o ocaso já iniciado.
- Eu preciso terminar minha missão... Tenho que me vingar de Shei Long para me tornar uma valquíria.
- Assim, nesse ponto descruzado tal fato já é considerado feito.
Os olhos da esfinge brilharam num tom vermelho dessa vez. A trovadora da espada viu-se livre e sentiu um par de asas irromper em suas costas. Ela sentia todo o poder invadi-la, sua força crescer, sua vontade tornar-se incontornável.
Derdeil Ophodda não se abalou com a morte de uma ou com o sucesso da outra. Ele apenas fechou os olhos e se concentrou. O escolhido do deus da magia buscou se focar no fogomágico que o habitava, vencer o que quer que fosse aquilo.
Mais uma vez, Derdeil abriu os olhos. Ele e os demais estavam em pé na fonte.
Dessa vez, no entanto, não havia porta com energia cromática. Também não havia rastros de alguém que caminhasse de cócoras.
Sem saber o que poderiam fazer, todos tornaram a tentar agarrar os peixes. Mas a atenção de Derdeil Óphodda foi desviado pela voz de Edgar falando seu nome em sua mente.
- Edgar está vivo - ele disse, enquanto Rufus erguia o peixe azul da água.
A porta de mesma cor se abriu e revelou o eladrin do outro lado.

- Queira perdoar minha emoção, ó poderoso mago - Edgar disse agitando as asas e voando para perto do velho.
- Isso não é nada, pequenino. Como lhe disse, aqui é o espaço das possibilidades para os que não irão sucumbir com esse mundo - disse Zalathorm sem alterar o tom de voz.
- Viemos como nos convocou, ó poderoso mago, mas eu sirvo o grande Derdeil Óphodda, que é quem merece todos os créditos por chegarmos até aqui.
- Então, pequeno ser que porta em si a energia do deus da magia depositada em ti por esse Derdeil Óphodda. O que há nesse homem que faz com que ele mereça ser salvo?

- Escutei outra voz. A voz de Zalathorm... - Derdeil disse mais uma vez errando um dos peixes que tentava agarrar. - Edgar está com Zalathorm.
Foram as últimas palavras dele antes de desaparecer.
- Que lugar é esse? - Disse Derdeil perdido entre a névoa. - Edgar?!?
- Estou aqui, mestre.. - respondeu o familiar pousado no ombro do velho mago envolto numa toalha.
- Graças a seu familiar e à sua perseverança, filho de Halruaa, você aqui chegou podendo sobreviver ao fim desse mundo que se aproxima. No entanto, isso passa por você escolher uma trilha que o desvincule dessa sina que não seja sua.
- Eu vim cumprir minha missão, nethyarca supremo. Temos de salvar Halruaa ou o que resta dela. Temos de levar esse poder a quem pode resolver tudo...
- Não diga esse nome ou você sacrificará todas as opções que restam para que escapemos a essa entropia que carrega tudo deste plano para o derradeiro final. Por que você o serve mesmo sendo ele um agente cabal da destruição de seu próprio mundo?
- Eu caminhei na escuridão quando servi a pálida sombra que era Azuth, que se achava digno de ser deus dos magos. Mas logo atingi o bom senso! Diga meu nome! Eu sou Derdeil Óphodda! Eu vim aqui como um cidadão dessa magocracia porque fui convocado por você, mas minha vontade só serve a um só: Rhange Hesysthance Sorrowleaf, o verdadeiro e único deus da magia e dos magos!
Ao termino dessas palavras, o deus da magia se materializou ali diante deles, decretando que seria o fim de Zalathorm e que Derdeil o servira bem como sempre cumprindo sua missão.
- Parece que sua mente está presa demais a esse mundo para sobreviver a ele... - falou Zalathorm e Derdeil percebeu que o que vira fora apenas mais uma ilusão. - Adeus, Derdeil Óphodda!
Dito isso, o escolhido do deus da magia foi destruído e Edgar voltou a ser um simples corvo. Mas não por muito tempo, com um toque do nethyarca no pássaro, Edgar sentiu mais poder do que nunca.
- Eu vejo que existe uma outra energia vital remanescente em você, pequeno corvo. Não seria esta quem merece prosseguir pelos múltiplos planos da existência?
- Sim, ó grande Zalathorm. Ela é realmente um ser único... Kaliandra Boaventura
A trovadora da espada viu-se num lugar enevoado bastante distinto da fonte. Não deixou de se surpreender ao deparar-se com o velho envolto numa toalha. Logo reconheceu Edgar no ombro dele.
- Esta é Kaliandra, mestre.
- Seja bem-vinda, futura valquíria. Espero que ao contrário de seu camarada esteja disposta a se desapegar dessa existência que se desfaz... - falou o velho mago.
- Eu sou movida pela vingança contra o maldito Shei Long. É isso que devo fazer para tornar-me uma valquíria. Nada mais me importa.
- É verdade isso? Nem mesmo a deusa dos elfos? Ou o destino desse belo povo? - Provocou Zhalatorm.
- É por eles que me vingo... - Ponderou Kaliandra.
- Sendo assim, sucumbirá com eles e esse mundo - determinou o mago.
- Desapega, Kaliandra - gralhou Edgar.
- Onde está... - ela ia pensando no companheiro, mas mudou as palavras. - Minha raposa Fox?
- Eu posso lhe oferecer sua vingança. Posso entregá-la a você antes do fim, mas desde que esteja certa de abandonar suas raízes nesse mundo perdido e seguir para as potencialidades maiores da existência múltipla - continuou Zalathorm.
A elfa ponderou entre a razão e seus sentimentos. Por mais que aquilo parecesse estranho, ela sabia o que fazer.
- Está bem. Eu aceito... Mas existem os outros... Mari'bel...
Dito isso, a guardiã killoren surgiu naquele ambiente úmido e esfumaçado. Ela também chegou sem entender muito, mas ao ver Kaliandra soube que aquele devia ser o tal Zalathorm.
- Seja bem vinda, pequena fada. Espero que como anunciado por sua aliada, você também esteja disposta a deixar para trás o cadáver dessa existência para buscar os brotos germinantes do universo - sorriu o velho mago.
- Eu não quero que esse mundo morra... Não aceito que perdemos para a aranhuda maldita! - Protestou Mari'bel.
- Se quiser carregar as energias vitais que a habitam para novos amanhãs é preciso que reconheça que o equilíbrio passa por deixar que o que deve perecer pereça.
A resposta do mago foi a concordância silenciosa de Mari'bel, que já sentia o luto em seu peito.
- Também tem o Rufus... - completou Kaliandra. - E minha raposa Fox.
O pequeno hobbit, ao contrário da raposa familiar apareceu ali.
- Isso é uma sauna? Por que você tá de toalha se tava aqui sozinho? Pronto, acabou? Podemos ir embora?
- Você precisa deixar pra trás isso tudo que acaba e... - foi dizendo o mago.
- Posso levar meu dragão? - Interrompeu Rufus. - Ele nem é daqui mesmo...
- Isso não será problema... - sorriu Zalathorm parecendo animado com aquele grupo. - Agora que todos que estão verdadeiramente prontos, devemos seguir. Seremos um grupo lançado nas correntes incertas da multiplicidade incontrolável dos planos. Os únicos que saberão que um dia houve um lugar como esse que deixamos. Assim como cheguei a este mundo trinta e sete mil anos atrás, deixo-o agora na companhia de vocês e...
- Derdeil. Derdeil Óphodda... Falta ele, mestre... - gralhou Edgar interrompendo.
Isso fez com que Derdeil Óphodda se materializasse mais uma vez.
- Rhange Hesysthance!!! - O escolhido do deus da magia surgiu dizendo.
- Nãããooo... - gritaram os demais, mas já era tarde demais.
Todos abriram os olhos. Estavam em pé na fonte.
Não haviam peixes dessa vez.
Logo viram que não haviam rastros, nem mesmo os deles.
Haviam apenas as seis portas de cores diferentes.
- Vamos ver as portas... - Disse Rufus Lightfoot para Ohterrível já caminhando para a porta roxa. Atrás dele veio Mari'bel rastreando informações nos menores detalhes.
Derdeil e Kaliandra trocaram acusações, mas isso parecia inútil agora.
A porta roxa não tinha nada e não parecia ter sido nunca mexida. O hobbit a abriu e encontrou uma escada que subia. A killoren encontrou alguns grãos de poeira de deserto.
A porta vermelha também nunca havia sido mexida, atrás dela, no entanto, havia uma escada que descia. Nela havia pequeninos cristais de enxofre.
A porta laranja não tinha sinais de ser mexida e também revelou uma escada que subia. Mas ali, Mari'bel não encontrou sinal de nada, considerando aquilo perfeito demais como numa ilusão.
Rufus averiguou o mesmo na porta amarela, assim como encontrou outra escada que subia. Mari'bel encontrou algumas pétalas no degrau.
A porta verde revelou outra escada que subia. No degrau havia pólen e folhas.
A porta azul também tinha sua escada que subia, mas nos degraus haviam sinais de gotas chuviscadas.
Eles discutiram por algum tempo qual seria o melhor caminho a seguir e até se haveria realmente um caminho a seguir que não redundasse em mais uma ilusão, despertando novamente na fonte. Cansada de tudo aquilo, Maribel retornou à fonte, fechou os olhos e pegou o peixe invisível. A porta marrom se abriu mais uma vez e revelou um corredor dessa vez.
- Esse é o caminho... - disse a guardiã de Timothy Hunter.
Sem mais demora, eles seguiram pelo corredor. Nele haviam rastros que de um elfo que seguiam até a porta central. Ao final dele encontraram três portas com símbolos em dracônico, um em cada: bem, mal, neutralidade. Analisaram as portas e não encontraram nada além das runas. Ao abrirem a porta da runa do bem puderam ver uma extensa planície de clima temperado.
- Estamos ao sul da Grande Floresta... - percebeu a serva da natureza.
Ainda assim, Rufus abriu a segunda porta, a da neutralidade, que revelou um frio intenso e uma montanha de neve.
- O Pico do Mundo... - disse Mari'bel que sabia ser fisicamente impossível os dois lugares estarem contíguos.
- E a última porta? - Questionou Derdeil, mas os demais não lhe deram ouvidos. Rufus e Ohterrível atravessaram a porta do símbolo do bem e viram que a passagem era como um pequeno túnel no pé de uma grande montanha. Os demais seguiram os dois.
A fada iniciada do arco encontrou por ali muitos rastros de hobbits, uma centena deles, de poucos dias antes. Mas o que realmente chamou a atenção deles foi a comitiva de elfos que passava no horizonte a norte dali.

5 de set. de 2015

Bêbados planos



O solar enfurecido lançou-se contra Derdeil Óphodda, que estava também à mercê do demônio de duas cabeças. O celestial cedeu ao descontrole e isso acabou fazendo-o errar seu ataque vorpal. Ele acabou cortando a fonte e as portas dispararam a bater. Rufus Lightfoot aproveitou o momento e resgatou Mari'bel usando suas mãos mágicas, arrastando-a pro que restou da fonte.


A mente da fada foi tomada pela visão transcendente de um magnífico anfiteatro. Ainda que seu tamanho fosse impressionante, havia algo de magnânimo naquele lugar. Ela identificou logo as divindades que palavreavam ao centro. Ele viu logo o ancestral sequoia que era Silvanus, bem como a mulher fornida e sorridente que era Chauntea, mesmo com a preocupação.

- O mundo está morrendo... eu...- ela dizia com lágrimas nos olhos.
Mari'bel reconheceu ainda Shar, senhora da escuridão, Talos, senhor da destruição, por serem deuses da natureza, e Bane, com quem lutara em Myth Dranor. Haviam ainda mais três, familiares, mas que ela não identificou de imediato.
Acoçado pelo Solar, Derdeil Ophoda escapou para outro plano. Ao ver-se numa ermidão nebulosa, entendeu que estava nas bordas das Planícies Cinzentas. No entanto, o solar logo usou seus poderes e foi atás do escolhido do deus da magia. O celestial surgiu e o agarrou, enforca-o, mas Derdeil conseguiu murmurar um nome:
- Rhange...
Ao fim do último fonema, o solar foi obliterado da existência.

Enquanto isso, Mari'bel se concentrava e tentava ver os deuses. Rufus e Kaliandra Boaventura pensavam em como protegê-la. Derdeil Ophoda usou seu fogomágico para trafegar entre os planos e conseguiu retornar ao aposento das portas. Lá, reunidos na fonte, eles se viram mirando outro lugar. Mari'bel percebeu que não era mais uma visão, eles estavam no anfiteatro.

- Seja bem vinda, minha filha - soou a voz do Grande Pai em sua mente. - Vejo que trás em você a força da primeira floresta, que sua alma é multiplicadora do equilíbrio. Meus olhos sorriem de vê-la assim, mas devo avisá-la que não há em quem confiar-se aqui. Nós devemos lutar pelo equilíbrio... pelo equilíbrio maior.
Mari'bel tentava dar conta daquilo e Kaliandra identificou o senhor do conhecimento, Oghma, bem como o senhor da guerra, Tempus, além dos deuses que a fada lhe falara. Havia outro ainda, um estranho deus escondido num velho manto cinzento, Morpheus. Todos pareciam se ocupar dele, mais que dos apelos de Chauntea.
Porém, a deusa da agricultura tombou exaurida nos galhos de Silvanus. Mari'bel e todos os seres viventes de Faerun sentiram um vazio em seus íntimos, que para guardiã killoren foi algo ainda mais forte. Mais foi a elfa aterrorizada que suspirou um nome:
-Rhange...
 Derdeil Ophoda tinha sua mente ocupada em outro lugar. Ele enxergava a multiplicidade da existência e o movimento cósmico dos planos como se fosse as escamas de uma serpente infindável num perpétuo movimento. Nada era, tudo estava. Ele sentia seu mundo perder-se, agonizar, mas ele já era um cidadão do cosmos. Curiosamente, uma força sedutora e sombria o convidava a deixar tudo aquilo e encontrar a plenitude. Kaliandra e Rufus sentiam o vazio que trás o luto e uma certa desorientação da falta.
Foi então de Rhange Hesysthance, o deus da magia se fez presente. Com seu sorriso sarcástico, ele fitou os outros deuses.
- Você não tem juízo de vir aqui - sorriu Bane golpeando com sua manopla a tribuna de onde falava.
- Nunca tive isso e veja onde cheguei, não é mesmo? - Debochou Rhange. - Posso fazer tudo de novo...
- Não comigo chefiando os trabalhos... - e com essa palavras Bane transformou o deus da magia num tasloi acorrentado.
Mas antes que algo mais pudesse ser feito, a atenção de todos foi capturada pela chegada de Lolth, com seu corpo monstruoso metade aranha, metade drow. Montado nela vinha um estranho demônio, que outrora fora um belo solar, Malkizid.
- Acabou! - Ela disse simplesmente. Isso criou teias finíssimas que prenderam a maioria. Mas a pequena Mari'bel conseguiu se manter livre, assim como Rufus. A fada serva de Timothy invocou o poder natural que houve, havia e haverá em sua vida e atacou a deusa Lolth. As flechas, no entanto, não só erraram, como retornaram para cravejarem o corpo de Mari'bel, ostentando-a no ar como que crucificada,
- Você não é nada! Se nem todos os deuses puderam me impedir, você acha que uma fadinha insignificante poderia? - Gritou Lolth entre a fúria e o triunfo.
- Lolth esse não era o acordo - gritou Rhange Hesysthance que seguia preso.
- Acordos foram feitos para serem quebrados - os olhos da senhora das aranhas queimaram uma chama púrpura.
- Eu sabia - gritou Kaliandra mesmo presa na teia. - Eu sempre soube! O que foi que eu disse? Vingança!!!
Os galhos colossais de Silvanus romperam a prisão de teias e agarraram o corpo de Chauntea. O deus das florestas despediu-se de Mari'bel, lembrando-a em sua mente de que eram agentes do equilíbrio, cada um tinha o seu papel e não podiam confiar em ninguém ali. Isso foi a última coisa antes de Lolth acabar com tudo.

Derdeil Ophoda despertou em um mundo estranhamente familiar. Ele chamou:
- Rhange...
- Eu estou aqui, meu profeta, meu filho.
- Onde estamos?
- Estamos no meu mundo, que assim sendo também é seu...
- É uma honra, mestre.
- Você saiu melhor que a encomenda, Derdeil. Graças a seus esforços conseguimos enfim fazer desse mundo nosso.
- E os outros deuses, meu senhor?
- Que outros deuses? Aqui Rhange Hesysthance é o caminho, a verdade e a vida... - ele deu um sorriso sinistro que assustou Edgar.

Mari'bel acordou em uma floresta Seu coração mal podia acreditar. Aquele cheiro do solo, o gosto das folhas, a temperatura do ar, a luminosidade sombreada, aquela era a Grande Floresta. Seu lar. Ela tateou as árvores mais próximas, mastigou uma amora silvestre que crescia num raio de sol. Procurou rastros, mas o que encontrou foi a desacordada Kaliandra Boaventura. A fada a socorreu, despertando-a.
- Rhange Hesysthance maldito! - Kaliandra gritou com a sede de vingança assim que despertou.
O deus da magia logo apareceu e falou:
- Vocês estão aqui. Mas isso não é ótimo? - Ele disse dominando-a e imobilizando-as. - Adiantaram ainda mais meus planos. Agora o mundo é meu. Agora todos os mundo serão meus. Nada mais pode me impedir pois abriram caminho dos planos pra mim... - foi a última coisa que elas souberam antes de se perderem de todo.

Todos acordam com a cara afundada na areia da praia. Sentiam-se perdidos, enquanto a água do mar vinha e lambia seus corpos. Rufus, Maribel e Kaliandra foram despertando aos poucos. O hobbit se levantou e viu um ser barrigudo pairando acima deles. Tinham dificuldade de lembrarem-se das coisas, mas Kaliandra queria se vingar, sentia a sede por vingança conformando seu ser, embora não soubesse de quem. Rufus se afastou em direção à floresta do outro lado da praia.
O ser barrigudo, que também era barbudo desceu e convocou um kraken. Depois ele fez surgir um banquete se fim. que Rufus comeu como se não houvesse amanhã. Kaliandra Boaventura seguiu gritando por vingança. Mari'bel não aceitou, pois embora não entendesse bem porquê, sentia que não devia confiar em ninguém estranho. Mesmo que seu entendimento dissesse que ele também era uma espécie de deus da natureza, seus instintos diziam para não confiar.
- De quem devo me vingar? - Gritou Kaliandra, que tentava pensar em deuses que a pudessem libertar daquela agonia. A única imagem em seu imaginário foi do gordo e barbudo recém-chegado. Ela o agarrou e perguntou para ele. - Diga-me, ó deus único que eu conheço, de quem devo me vingar?

Kaliandra Boaventura acordou deitada no chão de uma floresta. Sentia uma desorientação, além de dor de cabeça. Em sua mente uma palavra se repetia: vingança. Mas os dedos dela encontraram outra mão. Seus olhos logo viram um belo elfo de meia idade.
- Cameron? - Ela não sabia se a pergunta era para o elfo desmaiado ou para ela mesma. Após despertá-lo, ela viu que haviam muitos outros. Mari'bel, Rufus Lightfoot, Derdeil Óphodda, Edgar, Jorge de Capadócia, Braad, Chuck Norris, Sérgio Reis, Pena Branca. Todos iam despertando, mas também estavam confusos, perdidos. Não se lembravam de como haviam chegado ali.
Atormentada, Kaliandra sacou sua espado e a colocou na garganta de Cameron Noites:
- Quem é você? - Ela dizia sem controlar as lágrimas. Mas ele se desvencilhou do ataque e a beijou com paixão.
Kaliandra cortou a garganta dele e gritou:
- Bibianaaa!!!

Derdeil'Ophoda despertou sozinho boiando nas água de um fétido pântano.
Ele pensou sobre Edgar e o encontrou boiando ali ao seu lado.
Depois pensou na fada Mari'bel e foi a vez dela chegar trazida pelas águas turva. Lembrou-se de Rufus e viu o hobbit ao virar em outra direção. Pensou em Kaliandra e a avistou mais à frente. Foi então que ele sentiu que haviam tipos outros de magia ativos naquela realidade. Foi daí que ele viu que o cruzamento do tecido mágico e de tudo que o cercava era simétrico. Uma combinação perfeita demais. Tudo ali era um figmento de sua imaginação, até mesmo seus aliados. Ele forçou sua mente para despertar, buscando um poder maior que o habitasse.

Derdeil ÓPhoda viu-se na fonte. Estava inteira. Seus colegas estavam ali ao seu lado um tanto desnorteados como ele.
- É tudo uma ilusão! - Disse o escolhido do deus da magia
- Eu estou falando isso desde o começo.. - disse Rufus bufando.
Mari'bel orou para deuses da natureza.
Kaliandra Boaventura orou para Bibiana.
Derdeil Ophoda silencia todos:
- Isso é uma ilusão e temos que sair daqui. Como estamos sendo controlados? - Ele forçou todo seu conhecimento arcano. Derdeil conjurou um quebrar encantamento com o que lhe restava de fogo mágico e isso os fez ver uma porta multicolorida que flutuava no espaço. Kaliandra Boaventura percebia como aquele brilho prismático, na verdade, era a representação da conjunção de todas as energias possíveis nas existências, antes de cruzarem para o outro lado.

Todos despertaram... na fonte.

21 de ago. de 2015

Seis pesos e seis medidas... ou sete

Uma vez reunidos, Kaliandra Boaventura deixou claro que precisava encontrar o traidor Shei Long. Era sua missão como valquíria. Derdeil Óphodda disse que nada lhe traria mais prazer do que caçar a cabeça do nobre elfo, mas insistiu que deviam prosseguir, pois estavam adentrando ruínas milenares, tendo perigosos golens atrás de si que logo se reativariam.
- E quem é essa? - Perguntou o mago sobre a estranha mulher que chegara com eles.
- Nos encontramos no plano astral... - explicou Sérgio Reis. - Ela fez um contrato comigo em troca da minha alma.. é uma githyanki... 
- E o dragão? - Indagou Mari'bel.
- Eu sou Ohterrível... - disse o dragão mediano de bronze. - Estou em busca de novas experiências em minha existência...
- Em breve, Azuzu III. E esse kobold? - Quis saber Rufus Lightfoot.
- É Edgar... ele foi transmutado por uma armadilha mágica... - explicou Mari'bel. - E esse tapa olho?
- Eu sou um pirata... - retrucou o hobbit com satisfação, enquanto eles já desciam os degraus da antiga escada. - Tá no pacote da alma do bardo... 
Ao chegarem a uma grande porta de pedra, Edgar percebeu que havia uma armadilha. A tentativa de desarmá-la acabou disparando a mesma, causando um desmoronamento. Edgar, Rufus e Mari'bel escaparam ilesos, mas Kaliandra, Derdeil, Ohterrível e a githyanki acabaram feridos ficando um tanto presos entre os escombros. O bardo Sérgio Reis foi totalmente soterrado. Para livrá-los dali, o escolhido de Rhange Hesysthance invocou uma magia de criar passagem. Com isso, parte dos escombros desapareceu, Kaliandra pode pegar o corpo do bardo e adentraram o aposento por uma passagem ao lado da porta.
Certamente, eles não esperavam o que havia do outro lado. O vento forte já anunciava algo estranho. Eles se depararam com um colossal abismo cujo final não podiam perceber. Muito longe do outro lado havia um outro paredão de pedra onde poderia haver um túnel. Eles já podiam ouvir o barulho dos golens se movendo lá trás. Mari'bel via que os rastros que cruzaram a porta pareciam seguir desfiladeiro adentro.
- É uma ilusão.. - disse Derdeil, enquanto Rufus pedia à elfa a varinha de achar portais que recebera no plano astral.
- Depois, Rufus.. - disse Kaliandra se concentrando para tentar ver além da ilusão, mas sem sucesso.
- Espere, Kaliandra. Antes de avançarmos, tente enviar uma magia de mensagem para o grande Zalathorm, líder de Halruaa que buscamos resgatar... - ponderou Derdeil.
- Zalathorm de Halruaa, está é a direção correta para que o resgatemos? Nos diga como passar do perigoso abismo que temos diante de nós...
- O caminho é longo, deserto e o mau passeia aqui perto. Mas vocês não devem temer, pois tendo por guia seus corações logo chegarão a mim. - Retrucou o arquimago halruniano.
Então, o ladino hobbit pediu para Ohterrível segurá-lo e avançou para o vazio. Ele desapareceu e apareceu do outro lado, de onde podia ver seus aliados ao longe.
- Oiiiiiiiiii... - disse ele acenando do pequeno túnel onde surgiu. Os outros logo o acompanharam, mas viram que o túnel só seguia por cerca de cinco metros e terminava. Buscaram outros caminhos, mas foi Derdeil quem encontrou passagem no fim do túnel. Usando seus poderes mágicos, ele mostrou o medalhão em Z, que atraiu a atenção de Rufus.
- Que que é isso? Achei estiloso..
- É o medalhão de Zalathorm. Ele atraiu os golens contra nós e não tem sido muito útil...
- Deixa eu testar... - disse o hobbit alcançando o amuleto e colocando-o no pescoço. A partir de então, ele começou a ver o mundo de outra maneira. Tudo e todos pareciam perpassados por uma fina rede de energia esverdeada. - Uauuu... - Um par de mãos translúcidas e mágicas surgiu a um metro dele, se movendo em conjunto com as suas.
- Isso é o tecido mágico... - percebeu Derdeil.
- Ele parece intoxicado... - analisou Kaliandra.
- Acho que o item está limitado pelo alinhamento da pessoa... por isso não rendeu comigo... - ponderou o mago.
- Talvez ele tenha ainda mais efeitos comigo... me entregue isso, Rufus.. - adiantou-se a elfa trovadora da espada.
- Tira a mão daqui, tia. - Esquivou-se o hobbit-aranha pirata astral dando um tapinha com uma das mãos de mago na mão da elfa. - Deixa eu... uauuu.. - e ele encontrou o caminho secreto para que seguissem.
Do outro lado havia uma rampa elíptica e escorregadia. Os pequenos ladinos inspecionaram o que podiam para logo encontrar um chão que desmoronaria.Tentaram seguir pelas paredes, mas mesmo assim viram o chão sumir. Trevas sinistras se espalhavam lá embaixo. Rufus não percebia o tecido mágico nelas. Os outros vieram escalando, mas Kaliandra Boaventura que trazia o bardo atrapalhou-se e deixou o colega cair, vendo-o sumir na escuridão. Ela gritou, mas sabiam que não havia nada que pudesse ser feito:
- Enquanto eu carregar a alma dele, ele não estará perdido - disse a githyanki,
 Assim sendo, seguiram até que houvesse chão de novo e não mais trevas ondulantes. Encontraram uma porta entalhada dessa vez, era pesada e não parecia ser possível movê-la, ainda que Mari'bel visse nos rastros o contrário. A varinha em Y que Kaliandra recebera e que curiosamente estava com Rufus indicava aquela direção, mas também não haviam fios do tecido mágico nela. Ele tentou uma nova comunicação com Zalathorm:
- Aí seu Zala, tamo aqui numa dificuldade de passar e queremos saber como chegamos aí onde você está? Como passa da porta que não abre?
- O caminho é longo, deserto e o mau passeia aqui perto. Mas vocês não devem temer, pois tendo por guia seus corações logo chegarão a mim. - Retrucou o arquimago halruniano.
Sem muitas opções diante de nova resposta genérica, Rufus fez uso do amuleto e acabou levando-os para o outro lado em um aposento circular de arquitetura ainda mais diferenciada do que os anteriores. O centro dele era dominado por uma grande e bela fonte de três metros de raio. A estátua de uma mulher com uma harpa derramava água pelos olhos, enquanto que a escultura de um grande pássaro cuspia água numa parábola de sua boca e um entelhe de um dragão cuspia água para baixo como se fosse uma baforada. As três estátuas tinham as costas unidas, cada uma mirando uma direção do aposento, que continha seis portas equidistantes, cada qual com uma cor.
Mari'bel percebeu que os rastros de dias atrás que seguiam antes haviam se dirigido para a fonte e dali para cada uma das portas. Os rastros seguiam individualmente ou em duplas para as portas coloridas. Sempre um dos velhos com cajado para cada porta, quatro deles acompanhados por um dos mais jovens, mas havia um único rastro que não conduzia a nenhuma porta. Rufus se adiantou para a fonte, seguido por Derdeil e os demais, encontraram ali seis peixes, cada qual com uma cor, as mesmas das portas. Eles nadavam tranquilamente e tinham runas gravadas neles. Os fios da trama do tecido mágico não os alcançava, porém, e era como se seu nado sinuoso fosse justamente evitando a rede que formava a tradicional magia representada pelo deus Rhange Hesysthance. O escolhido do deus da magia já sabia bem que estavam lidando com formas outras de magia. 
No afã de agarrar um deles, Rufus Lightfoot viu que apesar de sua habilidade, os animais escapavam com destreza, mesmo das mãos mágicas. Ainda assim, ele trombou em algo que não enxergava, como se houvesse um outro peixe ali, mas invisível. A mulher githyanki se dirigiu para a porta a esquerda , que era vermelha. Passou a se concentrar e usar seus poderes psiônicos. 
Aos poucos eles foram conseguindo encurralar os peixes, até mesmo o invisível, fosse por sorte ou por azar. Uma a uma as portas foram revelando o que escondiam. Da porta azul apareceu um eladrin,
celestiais de Arborea, que trazia ervas e incensos nas mãos, além de um sorriso bucólico. Da porta amarela emergiu um furioso anjo solar
dos Sete Céus, que gritou ameaças e atacou Derdeil Óphodda tão logo pode, A porta vermelha revelou um temível balor do Abismo, que usou seu chicote de fogo para atacar a githyanki, quando esta enfim abriu a passagem com seus poderes psiônicos. Da porta roxa emergiu um monstruoso ser abissal com membros longos e desproporcionais, além de duas cabeças de chacal. Da porta verde, veio um equinal, um celestial que parecia um poderoso cavalo hominídeo de corpo tatuado. Mari'bel conseguiu ingressar pela passagem e vislumbrou um mundo magnífico e bucólico, os Campos Elíseos. Era como ver o mundo das fadas mais uma vez em todo seu explendor.
No entanto, rompendo aquele êxtase, o celestial alertou a pequena fada do erro do deus das fadas ao vincular o reino extraplanar dos seres feéricos a um plano material qualquer, mesmo que Abeir-Toril fosse seu lar. Por mais que fosse difícil para ela aceitar, o equinal Pésdypano explicou como o destino dos planos materiais era desaparecer e, assim, este passara a ser o destino do plano das fadas. 
A porta do peixe invisível era marrom e sua abertura permitiu a chegada de um inevitável. O ser geométrico e insensível usou seus poderes para aprisionar a githyanki num casulo de força e levou-a dali ao mesmo tempo que o anjo solar caiu em carga sobre o mago Derdeil Óphodda.
- Você vai pagar por seus crimes - ele gritou em celestial.